“A poesia diz respeito a toda a gente”
“Quem vence esse primeiro medo, essa timidez, em relação à força da poesia, acaba por descobrir que a poesia diz respeito a toda a gente.” Esta foi uma das mensagens que Valter Hugo-Mãe deixou no rescaldo do primeiro encontro “Poeta à Solta”, que decorreu na cidade de Barcelos no passado fim de semana. Hugo-Mãe falava após a inauguração da exposição antológica de pintura, desenho e colagem "O que é uma casa senão um parente extraordinário", que mostra trabalhos do artista, e que está patente na Galeria Municipal de Arte, até ao dia 11 de dezembro.
Antes, na abertura do evento, a vereadora do pelouro da Cultura mostrou-se muito feliz pela realização deste projeto, salientando que se trata de uma “semente, o primeiro verso de muitos mais que queremos escrever pelos anos vindouros, para que daqui a algum tempo possamos dizer que ponto a ponto, palavra a palavra, verso a verso, em plena liberdade fomos construindo o nosso poema.”
Promovido pelo Município de Barcelos, o evento resultou de uma parceria com o projeto editorial Officium Lectionis, com coordenação científica da Cátedra de Sophia (da Universidade Católica do Porto): a iniciativa, que decorreu sexta e sábado, evocou a memória de dois poetas minhotos: Guilherme de Faria (Guimarães, 1907- 1929), que viveu apenas 21 anos, mas deixou uma obra poética referencial do neorromantismo lusitanista; e António Pedro (1909-1966), um dos mais admiráveis criadores da história da cultura portuguesa, que se destacou na poesia, na pintura, no teatro e em tantas outras expressões estéticas, sempre com um inconformado sentido de busca.
Nesta 1ª edição do Encontro “Poeta à Solta”, participaram cinco poetas contemporâneos: Chus Pato; João Vasco Rodrigues; Jaime Rocha; Miriam Reyes; e Valter Hugo Mãe, este último que recentemente mudou a sua residência para a freguesia de Faria, Barcelos.
O testemunho de Valter Hugo Mãe
“Eu não poderia deixar de aceitar o convite e de estar presente neste evento, e de felicitar a organização porque considero isto, de facto, um levantamento de uma prática democrática e humanista.
Acredito muito em fóruns de discussão e debate de ideias, acredito muito que a cidadania se constrói e se fortalece a partir do encontro de expressão livre, e quando propomos às pessoas que venham discutir poesia não significa que estejamos a propor às pessoas que saiam da realidade e discutam alguma coisa que não nos sirva ou que não nos seja útil para os dias, muito pelo contrário, estamos a propor às pessoas que se reúnam numa espécie de força coletiva para encontrarmos soluções comuns, e portanto, eu acho que as autarquias que têm a coragem de sugerir às pessoas que se juntem para conversar são autarquias profundamente democráticas, são autarquias que constroem futuro.
A poesia é considerada o parente pobre da literatura e das livrarias, e isso acontece porque as pessoas são levadas por conceitos e preconceitos, e por isso tendem a achar que a poesia é um universo de dificuldade, que não lhes diz respeito por essa opacidade, mas a poesia está em toda a parte e tudo contém algo poético. E depois é uma codificação que pode ir sendo quebrada para aumentar a nossa capacidade de pensamento e imaginação. Por isso é que a poesia está ao serviço e à disposição de toda a gente. Quem vence esse primeiro medo, essa timidez, em relação à força da poesia, acaba por descobrir que a poesia diz respeito a toda a gente.”