Teatros europeus iniciam projeto único de transformação sustentável
Um grupo de instituições teatrais europeias de relevo embarcou numa ambiciosa experiência de sustentabilidade na área da cultura. STAGES, um projeto que resulta da colaboração entre 14 teatros parceiros, e que decorrerá de janeiro de 2022 a dezembro de 2025, irá testar soluções experimentais para os maiores desafios colocados pela crise climática. O projeto será lançado durante o Festival d'Avignon, na próxima sexta-feira.
STAGES – Sustainable Theatre Alliance for a Green Environmental Shift, que acaba de receber 2 milhões de euros em cofinanciamento da União Europeia, levará 14 importantes teatro a testarem, nos próximos quatro anos, soluções radicais para os maiores desafios impostos pela crise climática, onde se incluem:
- Impacto do carbono nas digressões internacionais: os parceiros apresentarão novos espetáculos sobre a crise climática, em vários países europeus (e até em Taiwan) sem movimentar pessoas ou objetos;
- Transformação sustentável de longo e curto prazo: um novo processo de autoanálise, baseado no entendimento holístico de sustentabilidade, expresso pelo conceito de Economia Donut, identificará as principais áreas de mudança nos teatros parceiros, inclusive em temas como design de figurinos, deslocações do público e equilíbrio entre vida profissional e pessoal dos trabalhadores;
- Sonho de novos processos criativos: uma série anual de eventos e workshops participativos num Fórum que reunirá artistas, cientistas e público, para sonhar com 'futuros desejáveis'.
O projeto surge numa altura em que os teatros procuram urgentemente novas formas de se tornarem resilientes e inclusivos, após dois anos de pandemia, ao mesmo tempo que reconhecem a clara necessidade de compensar o tempo perdido na implementação dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU.
O STAGES parte de um trabalho iniciado pelo Théâtre Vidy-Lausanne, um dos 14 parceiros do projeto, que passou vários anos a examinar a possibilidade de usar o conceito de Economia Donut – que propõe a criação de um modelo de desenvolvimento sustentável, que permita a prosperidade da Humanidade, sem que sejam ultrapassados os limites planetários – no processo de fazer teatro. A experiência deste parceiro será agora replicada Europa fora, com a criação de pontos de contacto entre os membros da STAGES e parceiros académicos, para mudar a forma como os teatros e o público se relacionam com o conceito de sustentabilidade.
Os parceiros do STAGES comprometem-se a repensar os processos de digressão, reencenando duas performances criadas por Katie Mitchell e Jérôme Bel para o Théâtre Vidy-Lausanne, usando elencos locais, cenários locais e até eletricidade gerada no palco. O processo começa a partir de um mesmo guião, compartilhado entre os parceiros, que vem acompanhado de orientações e notas de rodapé. Cada equipa criativa local pode usar os conselhos e recursos durante a sua própria reencenação ou fazer algumas adaptações.
Um dos primeiros resultados positivos deste projeto foi o apoio solidário a Trafó, teatro húngaro cujos recursos, depositados num banco de propriedade russa, foram vedados na sequência da invasão da Ucrânia. Metade dos parceiros do STAGES consentiu a partilha de fundos para que Trafó produza a adaptação da peça de Jérôme Bel e ainda coproduza um espetáculo adicional, na segunda metade do projeto.
Em declarações sobre o STAGES, Serge Rangoni, Diretor Artístico e Diretor Geral do Theatre de Liège, um dos principais parceiros do projeto, declarou que o “STAGES tem um foco na sustentabilidade social e ambiental, que é especialmente relevante para os teatros no contexto da pandemia de Covid-19, pois as instituições em todo o continente procuram novas formas de serem resilientes e restabelecer um relacionamento com o público que viveu imensas transformações sociais. Também tenta responder a uma pergunta difícil: é possível que os teatros continuem o seu trabalho presencial, indispensável com o público, em todo o mundo, sem aumentar ainda mais o seu impacto na Terra? E, ao mesmo tempo, o poder abrangente da cultura pode ser usado para ampliar a ambição, a criatividade e a inventividade exibidas durante o périplo STAGES, para mudar a forma como todos interagem com a sustentabilidade?”
Rui Catarino, Presidente do Conselho de Administração do D. Maria II, afirma que “na linha dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável adotados pela ONU, sustentados nos três pilares da sustentabilidade – económica, social e ambiental – aos quais se acrescenta o pilar cultural defendido pela Agenda 21 para a Cultura, o TNDM II tem feito um trajeto, ao longo dos últimos anos, de melhoria contínua do seu desempenho nestas áreas. Isto reflete-se no incremento do serviço público prestado pelo teatro a públicos diversificados, às iniciativas de inclusão social que promove, à diversificação das fontes de receita e, entre outros, ao desempenho ambiental do seu edifício e das suas práticas. O projeto STAGES é da maior importância para o Teatro Nacional D. Maria II, ao colocar um foco na sustentabilidade ambiental e social das artes performativas. Servindo como um laboratório de novas práticas artísticas e operacionais que permitam a redução da pegada carbónica dos teatros, promovendo ao mesmo tempo a participação de grupos tradicionalmente sub-representados no contexto cultural. Ao dedicar-se à “transição verde”, irá incentivar os 14 parceiros internacionais a desenvolver, adotar e disseminar práticas sustentáveis, o que, num contexto de preparação da obra de remodelação que o TNDM II irá sofrer em 2023, se afigura também como uma oportunidade única.”