A Escola da Noite: “O Homem do Caminho” despede-se de Coimbra

A Escola da Noite: “O Homem do Caminho” despede-se de Coimbra
Fotografia: Eduardo Pinto

A mais recente criação d'A Escola da Noite – “O Homem do Caminho”, de Plínio Marcos – despede-se esta semana do Teatro da Cerca de São Bernardo, em Coimbra. As últimas sessões têm lugar entre quarta-feira e domingo, em horários diferenciados.

A temporada de “O Homem do Caminho”, co-produção entre A Escola da Noite e a Quinta Parede, com encenação de José Caldas, termina no próximo domingo, dia 18 de Junho.

Estreado no início do mês, o espectáculo marca o regresso da companhia de Coimbra à obra do dramaturgo brasileiro Plínio Marcos, desta vez com um texto inédito em Portugal. Escrita originalmente sob a forma de conto e posteriormente adaptada para teatro pelo próprio autor, a peça é uma parábola que celebra a liberdade de expressão e apela ao desassossego e à inquietação, contra a paz podre dos “homens-pregos”.

Iur – o homem do caminho – é um artista ambulante que exerce as três grandes artes nómadas: contar histórias, criar ilusões e o sexo. Através delas – acredita – contribui para libertar os seus públicos das amarras que os condicionam. No texto que escreveu para o programa do espectáculo, Silvana Garcia, investigadora e professora universitária da Universidade de São Paulo, adianta: Iur “é aquele cujo nome secreto pode enganar a Morte e aquele que, com sua maestria e potência sexual, leva as mulheres-pregos ao êxtase; são dele as piadas que denunciam os preconceitos, é ele o mestre das trapaças, o dono da lábia que conquista a mulher mais bonita. Mais que isso tudo, ele é o Homem do Caminho, aquele que os homens-pregos perseguiram, espancaram, crucificaram; aquele que se tornou maldito por causa de sua poesia, que foi preso e banido por ela. Por fim, ele é o homem que sabe ler os mistérios que se escondem nas cartas do Tarô, que sabe de todos os destinos, mas que sabe também que não há destino selado”.

O espectáculo pode ser visto no Teatro da Cerca de São Bernardo, em Coimbra, na quarta e na quinta-feira às 19h00, na sexta e no sábado às 21h30 e no domingo às 16h00. A entrada custa 10 Euros, sendo aplicável o desconto de meio bilhete a menores de 30 e a maiores de 65 anos, estudantes, desempregados/as e à quinta-feira (preço único). Os bilhetes podem ser comprados na ticketline ou reservados antecipadamente pelos contactos habituais do Teatro: 239 718 238 / 966 302 88 / geral@aescoladanoite.pt.

 

Plínio Marcos (1935-1999) é um dos nomes mais marcantes do teatro brasileiro do século XX. Escreveu “Dois perdidos numa noite suja” e “Abajur Lilás” (apresentadas pel'A Escola da Noite em 2004 e 2012, respectivamente) e ainda, entre várias outras, as peças “Barrela” (1958), “Quando as máquinas param” (1963), “Navalha na Carne” (1967), “Oração de um pé-de-chinelo” (1969), “Querô, uma reportagem maldita” (1979) e “Madame Blavatski” (1985). Foi considerado um “autor maldito”, com várias obras proibidas pela censura dada a alegada “obscenidade” da linguagem empregada pelas suas personagens, quase sempre figuras marginais e do “bas-fond”.

Apesar de sofrer na pele os efeitos dessa censura e de ser obrigado a viver dos livros que ele próprio vendia na rua, nos bares e à porta dos teatros, Plínio ironizava com a perseguição: foi “sempre por merecimento. Eu nunca fiz nada para agradar às pessoas”. E encontrava uma explicação: “eu falo das transas nos estreitos, escamosos e esquisitos caminhos do roçado do bom Deus, das pessoas que estão por aí se danando, que moram na beira do rio e quase se afogam cada vez que chove, daquele homem que só come da banda podre, daquelas pessoas que só berram da geral sem nunca influir no resultado”.

Nascido no Macuco, bairro portuário da cidade de Santos, Plínio resumia a sua carreira da seguinte forma, na última crónica publicada, em Outubro de 1999: “Esse sou eu: saltimbanco do Macuco, meu bairro querido, o bairro da minha vida, o pedaço de vida que me deu tutano, sustento e energia, o pedaço de mundo que forjou em mim o amor à vida e a vontade de lutar contra qualquer opressor. Por ser do Macuco, me fiz guerreiro. Por ser guerreiro, me fiz lutador pela liberdade de expressão. Por tudo isso escrevi Barrela e, depois dela, um monte de peças.”