Universo dos Matarrachos, de Sérgio Amaral
Escondido no meio da natureza, está localizado o Ateliê de Sérgio Amaral e é ele quem nos convida a entrar no seu mundo. É a partir deste momento, que começa esta viagem mágica no seu Universo de Matarrachos. E preparem-se porque é uma viagem apaixonante e cheia de aprendizagens.
Sérgio conta-nos a sua história como se estivesse a ler um livro e é em cada palavra que sentimos o folhear da sua vida.
Conta-nos que por volta de 1980, quando levava a sua esposa até ao Caramulo para ela puder trabalhar, parava para observar alguns oleiros da região quando estes, manuseavam o Barro de Molelos. E foi a partir daí que o sentimento começou a crescer, desenvolvendo um interesse pelo artesanato, onde tomou uma decisão muito importante na sua vida. “Senti de alguma forma que podia dar continuidade”, referiu o Oleiro.
O artesão deu voz à sua paixão, que pouco a pouco, foi alimentada pela técnica. E houve várias influências que trouxeram sentido a esta arte, nomeadamente, trabalhos vindos de outros artesões, pois todos eles tinham uma coisa em comum, paixão pelo artesanato. Portanto, Sérgio arranjou uma forma de investir nesta área, ao frequentar uma formação em Oliveira do Hospital para desenvolver e aprimorar as várias técnicas que este ofício pede.
Conta-nos que o seu pai tinha talento para o artesanato, porém não fazia nada no campo da Olaria e por isso as suas influências vieram de mestres e artistas espalhados pelo mundo. Fala da referência que foi o Mestre Zé Maria, um Oleiro que pode ter influenciado o seu subconsciente em criança e que alimentou a sua criatividade. Sendo um pioneiro desta arte na sua família, consegue perdurar com o fascínio destas obras até aos dias de hoje, na esperança de que o ofício se eternize de geração em geração, “quem sabe um dia um neto, quem sabe”, confessa o artesão.
O ceramista conta-nos que colhe o seu próprio barro e que o coloca a “derregar”, “molhar” e a amassar num esmagador de uvas que reutilizou para servir de uma roldana adaptada. Fala-nos também que para existir um produto final é necessário preparar a matéria-prima com cuidado e que só depois, sobre a sua roda de oleiro ir moldando dando usufruto da sua imaginação.
A roda de oleiro foi uma das chaves essenciais neste processo e o escultor afirma que existe algo muito superior que lhe dá força para conseguir obter mais resultados. “Eu ali fui unicamente buscar a técnica, principalmente na roda e tem haver unicamente com a minha criatividade”, explica.
Ao longo desta viagem é notório que o artesão na criação do seu ateliê tornou-o num museu vivo onde expõe a sua arte, assim como, a arte de outros artesãos. É um homem de afetos e garante que é uma forma de fazer homenagem à vida ou ao trabalho de quem passa pela sua.
É no “Universo dos Matarrachos” que nos apercebemos do quão complexa é a obra criada pelo ceramista. Uma obra desenhada pela inquietação dos seus dedos pois, não consegue controlar toda a imaginação que possuí. Mas o resultado espelhado na obra simboliza uma diversidade e genuinidade natural, onde vemos que a identidade da peça é inconfundível e própria de si.
O escultor confessa que sempre viu a arte do artesanato como bonita e apaixonante e que qualquer pessoa que experimente mexer com o barro poderá facilmente apaixonar-se por esta arte do fogo. E por isso é que quando aplica a técnica de Rakú que é de origem oriental e consiste em trabalhos que possuem uma composição de óxidos muito fortes, onde os óxidos acabam por ficar bastante salientes. Este processo só é interrompido quando a peça sai do forno a mais de 1.400 graus e é mergulhada em água havendo um choque térmico. Nestas cozeduras de Rakú, o Sr. Sérgio abre o seu ateliê para que seja possível assistir a este momento único. É também ele, o autor de todos os químicos que a obra irá precisar, nomeadamente na técnica dos vidratos, onde funde os químicos em busca do “brilho” ideal que irá aplicar na peça.
Quase a acabar esta visita cheia de vida e história, num Universo de Matarrachos e arte em cada cantinho do seu ateliê, mostra-nos elementos de uma exposição feita em 2022 nomeada de “Contrastes”. Esta exposição foi realizada em Mangualde e o objetivo era atendendo às cores e formas das peças, uma multirracionalidade e multiculturalidade.
Com um olhar apaixonado, o ceramista revela-nos que o seu maior desafio é a vida, mas está convicto de que o futuro deste ofício está nas mãos de quem o cria por amor e é por isso que, até aos dias de hoje, não abandona esta arte que tanto o realiza e desmitifica o mundo dos seus padrões.