Obras e artistas internacionais como Artur Barrio, Eduardo Matos e José de Guimarães convidam-nos a visita-viagem durante este Verão no CIAJG

Obras e artistas internacionais como Artur Barrio, Eduardo Matos e José de Guimarães convidam-nos a visita-viagem durante este Verão no CIAJG
Fotografia: DR

As mais recentes exposições do Centro Internacional das Artes José de Guimarães (CIAJG) sublinham a ideia de “ficções de lugares”, tendo o museu como pano de fundo ou maquinaria invisível. Actualmente, este espaço conta com a presença de obras de uma figura chave na arte contemporânea que ocupa um lugar central na história da arte brasileira – Artur Barrio – que há mais de 50 anos vem alicerçando um trabalho que ecoa nos dois lados do Atlântico, entre Portugal e o Brasil, trazendo aqui também um olhar sobre o contexto africano, sob a curadoria de Luiz Camillo Osório e Marta Mestre em “Interminável”.

Neste espaço nascido no coração de Guimarães aquando da celebração desta cidade enquanto Capital Europeia da Cultura, vive também a "Fabriqueta", exposição individual do artista Eduardo Matos com curadoria de Inês Moreira. Uma instalação, uma arquitectura, um espaço criado e construído com acurada criação de desenhos, objectos e elementos correntes compostos em engenhosas instalações, num trabalho com dimensão arqueológica em que se ampliam sentidos e imaginários sobre territórios desindustrializados. 

Tudo isto acontece em convívio permanente com os trabalhos e as colecções de José de Guimarães que habitam o CIAJG em “Heteróclitos: 1128 objectos”, num momento inédito em que o público pode ver a totalidade da colecção do CIAJG em simultâneo, composta por arte africana, europeia, pré-colombiana e chinesa antiga, e obras de José de Guimarães. 

Nascido no Porto em 1945 (viajando com a família para Angola em 1952 e para o Brasil em 1955), Artur Barrio ocupa um lugar central na história da arte brasileira e portuguesa. Os seus primeiros trabalhos, no final dos anos 1960, realizados no contexto da ditadura militar no Brasil, comportam uma crítica implícita ao sistema político e artístico e ao processo de circulação e valoração da arte. Como artista, passa longas temporadas na Europa a partir dos anos 1970, visitando Portugal em 1974 para assistir de perto à Revolução dos Cravos. Hoje, Artur Barrio vive na Baía de Guanabara no seu barco "Pélagos". Esta brevíssima biografia traça um fluxo de trânsitos e atravessamentos onde o mar, na sua dimensão simbólica e real, assume um lugar central no seu trabalho: o do navegante solitário diante do oceano vazio. 

Galardoado com o Prémio Velázquez das Artes Plásticas 2011 e o Grande Prémio Fundação EDP Arte de 2016, entre vários outros, o trabalho de Artur Barrio encontra-se actualmente representado nas mais destacadas colecções de museus de arte contemporânea. A exposição "Interminável", que se espraia por todo o piso 0 do CIAJG, constitui-se ao redor da instalação com o mesmo título que pertence à colecção do museu S.M.A.K. (Gante, Bélgica) – parceira do CIAJG nesta exposição, a par da Fundação de Serralves –, tendo a especificidade de existir como obra apenas durante a vida do artista. Juntamente com a instalação, e ocupando várias salas do museu, apresenta-se uma selecção de trabalhos provenientes do arquivo do artista e de coleções institucionais e privadas de Portugal. 

Exibida pela primeira vez em Portugal (foi anteriormente apresentada na Bélgica e no Japão), a instalação "Interminável" evoca “o princípio e o fim da arte” e convoca o “excesso e a poesia.”, segundo os curadores Luiz Camillo Osório (crítico de arte, ensaísta e professor do Departamento de Filosofia da PUC-Rio, tendo sido curador do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro e, em 2015, curador do pavilhão brasileiro na Bienal de Veneza) e Marta Mestre (directora artística do CIAJG e Artes Visuais d’A Oficina), acrescentando que “o infinito e a contingência convivem no meio de palavras escritas nas paredes, café e odores espalhados no chão, fragmentos, vinho bebido e vertido.” À semelhança do restante trabalho do artista, "Interminável" desafia os protocolos museológicos e a objetualidade da arte. A instalação envolve materiais perecíveis e interfere na arquitectura do museu, deixando praticamente cobertas todas as paredes do espaço expositivo. 

Cobrindo um arco temporal desde os anos 1970 até ao presente, a lista de trabalhos tem como fio condutor a condição (i)material da produção de Artur Barrio. A dimensão política radical do uso de materiais perecíveis e abjectos; e a ideia de “inscrição” (riscar, submergir, escrever, perfurar, capturar...), as ações e traços do artista no mundo. Composta pela instalação “Interminável”, por “Registros” em fotografia, slide e filme das acções efémeras realizadas pelo artista na década de 70, a lista de trabalhos inclui também um núcleo dos seus “CadernosLivro”, trabalhos em tecido, e imagens reproduzidas a partir do arquivo pessoal do artista, relacionadas com o mar. A par de trabalhos icónicos como “Livro da Carne” (1979) ou “Áreas Sangrentas” (1975), este último realizado em Viana do Castelo no rescaldo do 25 de Abril, a exposição cobre ainda o interesse de Artur Barrio pelo mar, lançando luz sobre os trânsitos do Atlântico, e os abismos marinhos, que escrevem as várias moradas do artista. 

Por seu turno, a "Fabriqueta", exposição individual do artista Eduardo Matos no CIAJG, incide sobre o território fabril do Norte do país, em particular as memórias do trabalho e os elementos físicos (banais e prosaicos) que projectam tanto a melancolia quanto a força colectiva e laboral do Ave e do Minho. Com curadoria de Inês Moreira (curadora, editora e investigadora principal do Lab2PT da Escola de Arquitectura Arte e Design da Universidade do Minho), a exposição é uma apresentação de fôlego do trabalho de Matos, artista que, nos últimos anos, tem vivido fora de Portugal.

No centro da exposição, que ocupa todo o piso -1 do CIAJG, apresenta-se, em escala real uma “fabriqueta”. Expressão corriqueira para as oficinas que existem na região, e onde uma grande parte da população realizava, e ainda realiza, a continuação da jornada de trabalho, através das encomendas excedentes das principais fábricas da região, a “fabriqueta” de Eduardo Matos funciona na exposição como um espaço agregador das memórias de quem a visita. As palavras de Inês Moreira descrevem assim este espaço: "A fabriqueta é um fóssil humano que passou a integrar a paisagem, a par dos milenares penedos e das centenárias habitações de granito. Onde a produção do Ave e do Minho se viu pujante, restam, por entre lugares maiores, inúmeros destes sítios oficinais, rústicos e inacabados.”

A exposição pode ser entendida como uma grande instalação artística composta por núcleos, tais como um conjunto de desenhos (da série "Poesia Fabril"), objectos ready-made ou replicados que mimetizam elementos da arquitectura e contexto material das fabriquetas, um conjunto de esculturas e maquetes de cartão, papel e outros materiais que procedem do processo da exposição, trabalhos sonoros de voz e ruídos, e a "fabriqueta", propriamente dita. Especialmente concebidos para a exposição, estes trabalhos têm como característica o facto de “remeterem para um tempo anterior que aparenta ser rural”, sem deixar de considerar as grandes transformações económicas e sociais que o país atravessou nas últimas décadas.

O corpo de trabalhos da exposição distribuem-se no espaço como “achados arqueológicos” provenientes de um mergulho do artista pelo inconsciente e pelas memórias da sua infância passada na região. A “grade”, a “janela”, o “poço”, o “poste”, o “banco”, etc, são elementos de um extenso vocabulário, de “uma paisagem bucólica e inerte sobre as águas e as margens do Ave, que se envolve com a vida, o corpo, a voz e o movimento”, conforme descreve Inês Moreira.

De referir que exposição "Fabriqueta” conta com a parceria do Lab2PT (Laboratório de Paisagens, Património e Território da Universidade do Minho), do IPCA (Instituto Politécnico do Cávado e do Ave) e do CAAA (Centro para os Assuntos da Arte e da Arquitectura).

Tudo isto acontece em convívio permanente com os trabalhos e as colecções de José de Guimarães que habitam o CIAJG, convidando todos a uma visita para conhecer "Heteróclitos: 1128 objectos", exposição que ocupa todo o piso 1 do museu e que expõe a totalidade da colecção do CIAJG, composta por arte africana, europeia, pré-colombiana e chinesa antiga, e obras de José de Guimarães. 

Composto por 1128 objectos coleccionados pelo artista José de Guimarães e por obras da sua autoria, o acervo do CIAJG dá assim origem a um ensaio expositivo que mostra a sua totalidade, dando corpo a um debate entre linguagem, sujeitos e política. A crise dos objectos, que choca constantemente com o nosso quotidiano, é aqui encenada com uma colecção que, sob um mesmo gesto aglutinador, reúne materiais ditos «extra-europeus» e arte contemporânea, peças artísticas e religiosas, materiais provenientes de várias geografias e culturas. 

O capitalismo, o colonialismo, o mercado da arte e a globalização são processos históricos que determinam os museus do presente, necessariamente híbridos e impuros, levando as instituições a pensar novas relações e estruturas de sensibilidade. Diz-se heteróclito do que é excêntrico, irregular, fora do comum, ou seja, diz-se heteróclito de um acervo construído a partir de um gosto estético relacionado com o que é «exótico» e «primitivo». Heteróclito é aqui uma palavra de ordem para imaginar o futuro. 

A montagem desta exposição procura a fluidez entre as «reservas» e as salas de exposição, sublinhando o «trânsito» e o «tempo» de objectos tão distintos como os que compõem o acervo reunido por José de Guimarães. No interior do seu próprio espaço expositivo, "Heteróclitos: 1128 objectos" pensa artisticamente as relações entre objectos, pessoas, ideias e estruturas, enfatiza o «desacordo» ou o «dissenso» entre as coisas, a luta de identidades em que os elementos se canibalizam. 

A curadoria da exposição é de Marta Mestre, directora artística do CIAJG. No que toca à arquitectura dos vários núcleos, a autoria é de André Tavares e Ivo Poças Martins, combinando o paradoxo de expor a totalidade dos 1128 objectos da colecção com uma selecção de trabalhos de artistas disseminados ao longo do percurso expositivo.

As várias exposições do CIAJG podem ser visitadas por público de todas as idades de terça a sexta-feira, das 10h00 às 17h00, e ao sábado e domingo, das 11h00 às 18h00, encontrando-se a informação respeitante às mesmas e respectiva programação em www.aoficina.pt e www.ciajg.pt.

A entrada geral para visita a todas as exposições do CIAJG tem o valor de 4 euros ou 3 euros com desconto, sendo gratuita aos domingos de manhã (11h00–14h00) e continuamente para crianças até 12 anos. De ressalvar ainda a oportunidade de aquisição de bilhete conjunto para visita ao CIAJG e à CDMG (Casa da Memória de Guimarães) pelo valor de 5 euros ou 3,5 euros com desconto.