Comer menos peixe
Os oceanos ocupam 71% da superfície do planeta, mas apenas 2% desse vasto território marítimo está protegido. A emissão de gases com efeito de estufa, em resultado da queima de combustíveis fósseis, tem provocado, ao longo de décadas, um aumento da temperatura do mar e dos oceanos. Ao mesmo tempo, os glaciares derretem e o nível do mar cresce. "Os oceanos foram os nossos guarda-costas, mas estamos a perder essa defesa", alertou ao jornal El País Ricardo Aguilar, director de investigação europeu da Oceana, uma das maiores organizações do mundo dedica da esta área. Desde 1880, a temperatura média global aumentou o,8 graus e nos últimos 63 anos o ritmo a que sobe duplicou.
O problema mais urgente é a acidificação das águas, causada pelo aumento das emissões de dióxido de carbono (CO2) - terá crescido 30% desde o começo da era industrial. O pH dos oceanos desceu um ponto neste período, o que tem graves consequências para os ecossistemas marinhos. Espécies calcárias como corais, caranguejos, amêijoas e ostras estão ameaçadas porque não podem desenvolver as suas conchas, dado que o carbonato de cálcio que gera a subida do pH dissolve-as. Este processo afecta também os pterópodes - pequenos animais marinhos e o plâncton, a base da cadeia alimentar de muitos peixes, baleias e pássaros.
A poluição é outra das ameaças ao oceano e às espécies que nele vivem. Só no ano de 2010 foram despejadas cerca de oito milhões de toneladas de plástico no mar, segundo um estudo publicado na revista Science em Fevereiro de 2015. A organização não-governamental Ocean Conservancy estima que, em 2025, por cada quilo de plástico poderá haver três quilos de pescado. O mar é igualmente o último destino de produtos químicos e metais pesados, substâncias que causam problemas hormonais a peixes e mamíferos. Os problemas do oceano afectam também os humanos, já que quanto menor for a população de crustáceos e peixes, menor será o consumo destas espécies, que nos fornecem 16,7% das proteínas de origem animal que ingerimos, segundo a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO).
Portugal é um dos países com maior consumo per capita de peixe, um dado positivo para a saúde, mas que tem o problema de o apetite ser dirigido sobretudo a espécies de topo, como o atum e o bacalhau, que requerem mais recursos para sobreviver. O atum, por exemplo, alimenta-se de sardinhas, que por sua vez se alimentam de plâncton. Segundo os especialistas, o impacto do consumo de um quilo de atum equivale ao de dez quilos de sardinhas. A nível mundial, a procura de pescado é maior do que nunca: em 2012 foram 158 milhões de toneladas, pelas contas da FAO, enquanto 75% dos stocks de peixe es tão sobre explorados ou esgotados. A continuar assim, em 2050 a maioria das reservas chegará a níveis tão baixos que a sua exploração deixará de ser rentável.
As capturas ilegais não declaradas ou regulamentadas e práticas prejudiciais como as técnicas de arraste, que destroem o leito marinho e o desperdiçam, são uma das maiores ameaças à biodiversidade. A solução é conhecida há muito, mas enfrenta décadas de desconexão total entre cientistas e políticos: criar mais reservas marinhas, proibir a pesca industrial e favorecer a artesanal e sustentável. Isso implicaria reduzir substancialmente o consumo de espécies, para lhes dar tempo de recuperarem, mas os especialistas dizem que não haveria problema, até porque consumimos muito mais proteína animal do que a necessária. Significaria também reduzir, temporariamente, a actividade de um sector do qual vivem 120 milhões de pessoas, 8% da população mundial. Caberia aos Estados, então, apoiar os pescadores durante o período em que não pudessem trabalhar ao mesmo ritmo.
O consumidor também pode ajudar, escolhendo peixes menos ameaçados e em posição inferior na cadeia alimentar, como as sardinhas. O Oceanário de Lisboa criou há alguns anos o cartão S.O.S. Oceano, que permite fazeres colhas acertadas no momento da aquisição de peixes e marisco. O guia inclui também informação relacionada com a saúde humana, como peixes com baixo teor em colesterol, boa fonte de ómega 3, magnésio ou potássio e peixes que potencialmente acumulam metais pesados.