Heróis no meio do Atlântico

Heróis no meio do Atlântico
Fotografia: Azoresphotos.visitazores

As pessoas são simpáticas, e isso nota-se até em algo tão banal como o trânsito: todos param mal nos aproximamos de uma passadeira. Notamos o mesmo ao entrar numa loja, num café ou restaurante, ou quando pedimos informações no meio da rua. Angra do Heroísmo fica na Ilha Terceira, assim chamada por ter sido descoberta depois de Santa Maria e São Miguel, no século XV.

O centro histórico foi o primeiro do país a ser classificado como Património Mundial, em 1983. A Unesco destacou especialmente o traçado e a arquitectura da cidade, testemunhos da história portuguesa e de toda a navegação no oceano Atlântico. A imponente Sé Catedral, do século XVIII, demorou 48 anos a construir e é o maior templo dos Açores. Muito perto encontramos o Palácio dos Capitães-Generais, sede do primeiro governo unificado do arquipélago.

Reparamos numa ampla praça com pequenos blocos de pedra de calcário e basalto. Chamam-lhe Praça Velha e foi a primeira em Portugal a ser projectada como ponto de encontro entre dois arruamentos, seguindo os ideais do Renascimento. Ao longo dos anos acolheu mercados de galinhas e gado aos domingos, corridas de toiros, e foi palco de enforcamentos, durante as lutas entre liberais e absolutistas.

A nobreza das formas e o exotismo e preciosidade dos materiais marcam não só a arquitectura como também a escultura, talha, porcelana, azulejaria e mobiliário de Angra do Heroísmo, criando um legado artístico de valor incalculável.

Avistamos o oceano ao fundo, e é encostado a ele que descobrimos a bela Igreja da Misericórdia, no local onde funcionou o primeiro hospital do arquipélago. Estamos na marina de Angra do Heroísmo, uma das mais importantes da história portuguesa. Do lado opos- to da praia podemos conhecer os parques arqueológicos subaquáticos da cidade: um cemitério de âncoras e o que resta do naufrágio do Lidador, navio português do século XIX. Da marina avistamos a enormidade do oceano, as mesmas águas rasgadas pelos descobridores portugueses, que cedo perceberam que a baía tinha excelentes condições para uma aportagem segura – desde o século XV que é considerada “porto de escala dos mares ocidentais” e paragem obrigatória para os navios que cruzavam o Atlântico.

A cidade era frequentemente atacada por piratas e corsários que queriam apoderar-se das riquezas trazidas da Índia, por isso foram construídas várias fortalezas, com destaque para a de São João Baptista, uma das maiores de sempre, com quatro quilómetros de muralhas a envolverem o Monte Brasil, um vulcão extinto.

Por essa altura a cidade chamava-se apenas Angra, nome que se manteve até ao século XIX. Durante a Guerra Civil de 1832-1834, D. Pedro organizou aqui a expedição que levou ao desembarque no Mindelo, decisivo para a vitória dos liberais sobre os exércitos do rei de Portugal, absolutista.

Foi também nesta cidade que depois promulgou alguns dos decretos mais importantes do novo regime, como o que reorganizou o exército português, o que aboliu as sisas e outros impostos ou o que promulgou a liberdade de ensino no país. Em reconhecimento por tantos e tão destacados serviços, o decreto de 12 de Janeiro de 1837 conferiu à cidade o título de mui nobre, leal e sempre constante cidade de Angra do Heroísmo.