Impérios no feminino
O culto sempre foi considerado parte integrante da cultura açoriana, e nem a oposição da Igreja ao mesmo a partir do século XVI, classificando alguns dos seus aspetos como “heresias simoníacas”, conseguiu extingui-lo no arquipélago, ao contrário do que aconteceu no continente. Os conflitos, as proibições e as ameaças de excomunhão, pendentes durante séculos, provocaram o efeito contrário, com a população a assumir o culto como uma marca da sua identidade.
O sentimento foi consagrado pela política regional, que em 1976 decretou a Segunda-Feira do Espírito Santo como Dia dos Açores. “O culto ao Divino Espíeiro Santo será, certamente, dos mais próximos e queridos de todos os Açorianos”, sublinha o presidente do Governo Regional, Vasco Cordeiro, que lembra que estas festas acompanharam sucessivas gerações nas nove ilhas, mas também nos seus “percursos de emigração”, e por isso constituem hoje “um valioso património cultural que projeta a região”.
Eduardo Elias, do Vizit Azores, site de informação turística do arquipélago, refere que os Impérios movimentam “centenas de milhares de euros”, sendo “evidentes as mais-valias para setores como o comércio local, os transportes, a hotelaria e a restauração”, ao que se soma a notoriedade que as festas acrescentam ao destino Açores.
A tradição evoluiu, que o digam os foliões, substituídos, na sua maioria, pelas filarmónicas. Eram eles que, outrora, anunciavam, e dirigiam as cerimónias, dançando e cantando jocosamente. Resistem as touradas à corda, os bodos de leite, a distribuição de massa sovada aos irmãos e as cantorias improvisadas. Em cada semana de festa, reza-se o terço à noite no Império, perante a coroa e o ceptro encimados pela pomba, e realizam-se as “alumiações”, veneração das insígnias do Divino na casa do Imperador.
O número de irmãos, inicialmente limitado a 13, cresceu até às centenas, havendo mesmo o hábito de inscrever os filhos logo ao nascer como devotos do Senhor Espírito Santo. Só existem Impérios masculinos mas já houve femininos. Em 1697, D. António Vieira Leitão, então bispo de Angra, proibia, sob pena de excomunhão maior e de 50 cruzados de multa, os “impérios de mulheres que se fazem sob pretexto de festejarem o Espírito Santo mas que não servem mais do que para se ofender, com eles, o mesmo Senhor, pelos “enfeitos” indecorosos e profanos que as ditas mulheres usam em tais atos pelo concurso dos homens que a eles vão, com práticas indecentes e outras enormidades de que resulta geral escândalo”.